Mar Portuguez
Ó mar salgado, quanto do
teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale
a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa, Mensagem
Este poema “Mar portuquez” de Fernando Pessoa me persegue e traduz a
minha trajetória profissional e acadêmica.
Comecei na educação num impulso de querer dar certo, de querer cruzar “os
mares” que antes não tinha nem me dado conta que existia. Quer ser artista?
Quer ser educador? Uma oportunidade me foi ofertada em agosto de 1993. Recém
formado em técnico de edificações, via no Projeto da Animação Cultural do
professor Darcy Ribeiro uma oportunidade de conhecer este “mar” nunca antes
navegado.
“O mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal”.
Fui conhecendo uma realidade que ainda me desafia e cansa. Trabalhar em
escolas públicas de periferia, é como vê a desigualdade social de perto sem
nenhum mascaramento midiático. É assustador e desafiante ao mesmo tempo. E eu
ainda não desisti. Estou aqui neste curso buscando novos atributos que possa me
reinventar agora como artista-educador. Será que é isso que eu sou? Considero
que no início desta trajetória pude me reinventar durante 18 anos na Animação
Cultural, sendo um competente animador cultural. Realizei tantas coisas:
exposições, festas, espetáculos, musicais... Ultrapassei tantos obstáculos que
acabei buscando a lapidação do meu ser, do meu artesão intelectual em cidades
históricas do nosso Brasil Cultural como Ouro Preto. E foi nas ladeiras da rua
da direita que encontrei uma vontade de ir além. De voltar a estudar. E depois
de tantas oficinas e cursos na área de teatro, literatura, artes plásticas...
Fazer um curso universitário naquele momento se transformava na minha grande meta.
Os Festivais de Inverno de Ouro Preto foram uma escola sem paredes, sem
carteiras, sem bancos. Uma escola que não cabia em nenhum edifício. Se os
homens soubessem da importância que tem a experiência, o lado lúdico da vida.
Empirismo sim, por que não? Precisamos humanizar a intelectualidade.
De volta para a realidade mais dura, sóbria e densa, enfrentei as
preparações “vestibulescas” e depois de várias tentativas não bem sucedidas, acabei
me encontrando intelectualmente no curso de Ciências Sociais. O ano era 2000, o
ano que tudo acabaria em cinzas. Para mim foi o ano do recomeço. A vida
acadêmica. Num processo de reconstrução que durou cinco anos e meio, fiz do meu
trabalho como Animador Cultural uma porta para o universo das discussões
teóricas. A minha monografia enfatizava a vida de um aluno que tinha experienciado
o Movimento dos Sem-Terra. Foi incrível ser um observador-participante. Tomei
banho de rio, caminhei por entre as matas e transformei tudo em pesquisa. O
encanto soava os meus ouvidos:
“Tudo vale a pena, quando a alma não é pequena.”
Depois de (dês)formado, a minha pesquisa que virou monografia de final
de curso me levou para um Congresso na Argentina, na província de Salta. Mais
uma experiência que não consigo traduzir em palavras. Apresentar a minha
pesquisa em terras “hermanas”, me deu um motivo maior. Na ânsia de ser um artista-educador mais uma vez, fui
almejando a possibilidade de ser um educador da sociologia através da parceria
que a Universidade Cândido Mendes com o Instituto A vez do Mestre estava dando
para os recém formados que não tinham a devida formação pedagógica.
Encarei um ano e alguns meses.
Fui bem sucedido. Logo já estava atuando como professor de sociologia em uma
escola privada da cidade de Campos dos Goytacazes.
“Quem quer passar além do Bojador, Tem que passar além da dor.”
Assim fui
adiante e sem pestanejar acabei sendo professor da escola de ensino fundamental
que tinha me ajudado naquela formação de sonhador. Refiro-me ao Instituto de
Educação Professor Aldo Muylaert. Nos
momentos que os meninos mais severos queriam me bater por ser diferente, os
professores dessa escola foram depositando em mim a crença e a esperança de
dias melhores. Não abri mão desses ensinamentos. Hoje estou em Resende,
trabalhando como educador-artista da SEEDUC-RJ em duas matrículas. Hoje estou
mais uma vez me reinventando e me propondo a não parar no meio do caminho. A
vida vale à pena. Busco nesse curso de pós-graduação uma continuidade da minha
formação.
Bom, preferi
me apresentar desta forma, pois o mundo está muito irracional. A razão também
se apresenta como poesia. Queria ir além do currículo formal. Por que não
podemos nos apresentar desta forma? Quero fugir dos padrões. E para que tantos
padrões? Não estamos aqui para reinventá-los? Não quero desistir de ser um
artista-educador, assim como Fernando Pessoa não desistiu de ser um poeta
navegador.
Insisto em dizer que nessa vida de busca :
“Tudo
vale a pena, quando a alma não é pequena.”
Rudolf Rotchild Costa Cavalcante
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